Sunday, October 29, 2006

Poesia-Bêbada de um apaixonado

Quero um fluxo de palavras, senão belas
Ao menos enganosas, disfarces da minha Arte.
Uma boa ilusão salva uma vida,
E como poeta quero iludir a dor, a fome e a miséria,
Cantando o Amor que não existe, abortado
Pelo medo, pela solidão e pelo nonsense do sentido.

A cura para os meus anseios repousa imediatamente ao meu lado,
Separada de mim por uma muralha de carne com concreto,
Acimentada por uma ideologia mais antiga que meu nascimento,
E o nascimento de meus avós e tataravôs, e por seres anteriores a eles.

O que faço agora, bêbado como um mendigo de rua,
Acreditando que a aura etílica me deu forças para me livrar
Dos meus horrores mais internos; do meu descompasso ao falar,
Do blackout mental que me acompanha desde meu nascimento,
E que infectam a área não regular da minha alma,
Teimosa essência que vive a me gritar que no fundo, bem no fundo,
Este não sou eu.

Como posso imaginar que o prazer e o Céu estão tão próximos,
E eu, que me ajoelhei em entrega total e não titubeei em rogar promessas de amor,
- que não caberiam nesse verso, nem em centenas de outros – ,
mas não pareço ser capaz de cumprir agora, bastando-me apenas,
Escalar a fronteira que estás a me dizer: não!, porém que não pode ser maior
Que o meu Amor.

Minha alma, classificada como imortal e grandiosa,
Não é mais que um leve gracejo e um lampejo de criatividade.
Eu me perco no rio dos martínis, na cachoeira dos vinhos e nas torneiras de vodka.

Penso em quem realmente sou... Sei que sou um amnésico por nascença,
Condenado a esquecer meus momentos mais intensos, onde residem aquelas emoções,
Que nunca voltam para nos lembrar o quanto esquecemos de nós mesmos.
O quanto ainda esqueceremos, a cada hora e minuto passados, em levas apressadas de anos.

A dor não cresce tanto em meu peito,
Pois troquei o conforto das minhas dores,
Das minhas feridas, e dos meus sonhos quebrados,
Desiludidos, deturpados, degenerados, destruídos,
Por este poema, podre e pustulento,
Que não engrandece nem mesmo uma metáfora.

Este poema foi programado para morrer esta noite,
Junto com os restos dos meus sonhos e fantasias,
Determinados para exaurir-se esta noite, pois assim ordena,
Aquilo que reside em minhas profundezas,
Seja lá coração ou alma, espírito ou energia,
Moradora de plenos poderes sobre o ser que pulsa todo em mim.
Destarte, sou eu mesmo.
Hoje sou passageiro,
Como o álcool que caminha em minhas veias,
Como as dores que me cortam e recortam,
Como a excitação exasperante que me grita.

Adentrar os reinos do teu corpo... Isso sim seria eterno!